Há tempos eu cogitava escrever um poema que me possibilitasse recuperar parte da memória emocional de minha infância, os dias intensos que passei nas ilhas da Amazônia, as sedutoras praias de Algodoal, do Marajó.... esses momentos distantes. Um belo dia, após reler as muitas epígrafes de Moby Dick, de Herman Melville, para uma de minhas filhas, encontrei um modo de, digamos, fusão literária das minhas várias impressões de sal e sol, mar, paixão e aventura, com a melancolia dos rios da minha terra. Este poema consta do livro Ters, que pode ser encontrado em e-book na Amazon.com.br.


Corsários


A taverna é rubra,
o chão recende a peixe e cervejas.
Na janela, um simpático e quarentão pirata
não esconde seus olhos de aventura,
mostra-os ao mundo
na força e vigor de muitas mortes.

Seu rosto rebrilha os cristais submersos,
o ouro nu das catacumbas
e os objetos raros das cruéis pilhagens.
Longe das margens seu navio aderna,
vacila e sonha – e não encontra pouso.

Ele foge das naus perseguidoras
em um humilde e vagaroso bote,
foge ainda de si mesmo, parte,
como um tonto, da estelar, da Alba.

Por entre rochas, visitando ilhas
solitárias como túmulos, não descansa,
e arrasta seus tesouros,
fantasma a suportar dez mil correntes.

Resiste às chuvas, aos sóis perseguidores
habita o charco, a úmida caverna,
a cela abandonada entre despojos,
mas não encontra calma.

Náufrago erradio,
Otelo claudicante,
Iago em chamas,
não suportou que insolente timoneiro
lhe levasse o lume da estelar,
da Alba.

Alba – armadilha, força –
dama de corsários,
levou consigo a luz,
nácar, ouro e voz
– até um peixe-espada –


e a paz dos condenados.

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