Três poemas amargos de Max Casablanca



O rei da rua


Sabiá tem só 14 anos
e cinco assassinatos.
Franzino, ergue para o alto o braço 
quase sem músculos,
arco de violino,
e diz, a arma em punho:

"Tainha será o próximo
– e Lucicleide, aquela puta!"

Ninguém o confronta em sua sanguinária
loucura de menino monstro;
nenhum o olha de frente, 
os pivetes puro-medo de sua gangue de garotos.

Sabiá é o rei da Rua do Urubu,
do Cais do Ferro Velho,
do Beco das Piranhas.

Sabiá é o rei de porra nenhuma!

Ontem à noite ele morreu assassinado com seis tiros
no peito pele e ossos.

Quem matou Sabiá foi Lucicleide, 
à queima-roupa.

Lucicleide tem só 16 anos
e oito assassinatos.
Lucicleide sabe escrever e ler, e faz poemas.
Lucicleide é a rainha do Beco das Piranhas.



Tic tac

Os anos se foram.
Perdi olhos e tempo. O coração, fraco.
Sinto-o agora como quem ouve uma batida
irregular de repenique,
aquele tum tum.. tum... sopro de vento;
o estralar duma corrente 
que se partiu ao meio-dia,
mas que inda arrasto pelo chão do quarto
(saturado de fotografias)
até altas horas.

O que mais aflige é o não dormir
tic tac
enquanto as luzes se apagam
na casa ao lado
tic tac

No meio da noite um menino chora,
um homem rebenta os pulmões
em tosse crônica... um...

Toda madrugada é assim:
o menino, o homem,
o alarido, os cães na rua...
E eu aqui a olhar pela janela
os carros que passam, 
alma sonâmbula à beira dum abismo,
o coração desacelerado de senilidade à espera
tum... tum... tum... fraco fraco fraco
O que ele tem?
Doente, mal, despedaçado.



Planeta XXI


O mundo está foda, meu filho.
Quando imaginamos chegar a alguma racionalidade,
surgiram o celular, a internet e as redes sociais.
Aí tudo foi à merda.

Ser humano algum suporta mais a face de si mesmo
sem a luz do Photoshop.

Nada existe se não flagrado em video-selfie,
gravado em dubsmash.

Não fique aí parado à espera de que compreendam
tua interpetração do mundo e da política;
tua posição quanto ao cristianismo.

O islamismo, o socialismo, 
o homossexualismo, o teatro vivo... Ah!
Ninguém quer saber de ti, ó cara-pálida,
se não fores do mesmo time,
da mesma seita.

Fodam-se o teu discernimento, a tua razão de última hora, 
o teu desprendimento tardio,
o teu comportamento padrão-Fifa.

Não vem, não, meu irmão. Fica na tua.
Pede pra cair e vai saindo de mansinho.
E não olha pra mim,
senão te quebro a cara.


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